Os perigos escondidos para quem já está em perigo. No Brasil, a categoria – que nunca teve vantagens significativas vindas de quaisquer Governos Federais – agora corre risco até de extinção
Desesperar jamais mas quando a fome bate à porta alguns cuidados importantes caem dependendo da força de quem sofre. Mas a música é maior que tudo e tem demonstrado isso com seu poder transformador ao longo dos anos.
Não estamos tendo alívio nos dias de hoje. O Covid-19 desmontou todas as cadeias produtivas da música, no mundo todo. No Brasil, a categoria – que nunca teve vantagens significativas vindas de quaisquer Governos Federais – agora corre risco até de extinção por conta de clara perseguição deste governo que aí está.
Desde os primeiros dias de confinamento muitas mobilizações de todos os tamanhos buscando ajudar aos mais necessitados, e as marcas/eventuais patrocinadoras abriram os olhos para isso. Eis um perigo: quanto vale se associar a tal marca e quanto valemos agora?
Num ambiente de tanta carência afetiva e de trabalho (com a paralisação dos shows com plateias, principalmente) uma enxurrada de lives inundou as redes. Num primeiro momento me soou mais terapêutico e afetivo, mas também boa chance de promoção, de aparecer mais para seu público e se apresentar para novas plateias virtuais e ampliar seus seguidores. Num segundo momento: Como sobrevivermos a tão longa paralisação? Como monetizar essas lives? Que mais pode ser feito e monetizado?
Uma benesse desses dias de hoje são as muitas discussões sobre direitos e percentuais sobre essas performances online, mas , eis um perigo: quando há eventual patrocínio para essas lives, quanto cobrar? Qual a entrega? A live vira fonograma? A live fica no site de quem pagou aquele valor 10 vezes menor do que o artista vale – e muitas vezes precisa?
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Não vejo nada melhor que uma chamada de união da classe, em seus nichos, mesmo que em grupos, subgrupos, mas plurais; do mercado num todo. Vejo e participo de alguns grupos relevantes de produtores e artistas mas não vejo neles (e talvez nem seja apropriado dentro deles por terem muita gente de outras áreas também) discussões sobre patamares de cachês. Isso é fundamental.
Não se trata de cartelização, mas de proteção de mercado e sobretudo proteger os mais frágeis (quer por ignorância, por ansiedade ou por necessidade) num momento onde as poucas oportunidades vigentes valem muito, cedem ao que for oferecido, sem ler o contrato onde ele doa muito mais do que recebe.
Difícil pra quem está com fome, mas vai ter muito mais comida para todos com participação e comunicação mais ativa entre agentes, produtores e artistas, com todos os jogos na mesa, tudo mais claro para ser tudo mais justo.
Não haver essas trocas e discussões internamente, de grupos e nichos, facilitará uma exploração exagerada – até desonesta em alguns casos – contra o artista e sua obra.
Esse tema me remete à exportação da música brasileira, a qual sou um combativo promotor e agente desde os anos 90. Como é difícil erguer a carreira de uma artista brasileiro lá fora!
Tenho vários casos parecidos com diferentes artistas e diferentes épocas: o artista está super-bem no mercado vendendo discos e turnês. De repente surgem dois ou três do mesmo gênero (algumas vezes do mesmo país!..) e passam a praticar cachês bem menores, menos gente viajando, coisas assim.
Eis um perigo: dumping, tiro-no-pé, trairagem, ingenuidade, ganância, burrice, ansiedade? Não sei adjetivar, mas falta aí a tal comunicação entre agentes interessados no mesmo mercado. Não é para ser concorrência, mas para ser uma frente. Forte.
Assim traço uma analogia com os dias de hoje e o que estamos vivendo com esses Editais e Patrocinadores do momento. Pensar, repensar, compartilhar informações, buscar ouvir e discutir com seus colegas antes de qualquer passo (– mesmo a perigo! – ) para não sofrermos mais do que já estamos e nos preservemos mais e nos preparemos melhor para o mundo novo que vem aí.
Rio de Janeiro, 14 de maio de 2020, no meio da Pandemia global