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Clarinetes e saxofones: cuidados e manutenção

Nesta coluna, com a colaboração do luthier Daniel Tamborin, mostramos alguns problemas e soluções que os clarinetistas e saxofonistas podem encontrar nos seus instrumentos.

Identificando e solucionando problemas

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Os problemas mais comuns nos clarinetes e saxofones são os vazamentos e molas que se quebram. São os grandes vilões e que acabam deixando os músicos em situações delicadas nos momentos mais preciosos. Mas existe muito mais coisas que você precisa saber.

1. VAZAMENTOS

No clarinete, as sapatilhas estouram. Elas são feitas de um material chamado baudruche e tem um tempo de duração, que vai de um ano e meio à dois anos, a partir daí o risco de estourarem é grande ocasionando os vazamentos.

Os saxofones possuem as sapatilhas mais resistentes, porém apresentam problemas de desregulagem com o tempo.

As sapatilhas utilizadas nos saxofones Selmer são especiais, hidratadas e preparadas para água, duram muito tempo.

As clarinetas Buffet Crampom top de linha (Prestige e Tosca), estão utilizando uma sapatilha que chama gortex. É uma sapatilha comum feita de papelão, feltro e baudruche, e por cima, um material sintético semelhante ao teflon. Essas sapatilhas duram muito tempo, oito anos ou mais.

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CUIDADOS

Muitos clarinetistas tem por hábito, soprar as sapatilhas quando a água se acumula. Não faça isso, a água se espalha deixando-a mais difícil de secar.

CONSERTANDO EM SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA

Tem o famoso “Kit de Emergência Brasileiro”, que é elástico e fita teflon (aquelas brancas de consertar encanamento). 

Nesta situação, o teflon pode ser utilizado. É a solução mais rápida e funcional. Coloque a fita sob a sapatilha estourada. Dessa forma é possível melhorar a vedação evitando uma situação delicada na hora de tocar.

O teflon deve ser visto como uma solução de caráter emergencial. Passada a situação de sufoco, é necessário trocar a sapatilha com problema.

2. SAPATILHAS GRUDANDO

Os clarinetista são muito detalhistas, e não gostam que as sapatilhas façam barulho, nem aquele barulhinho ao se descolarem. Já os saxofonistas não ligam muito para isso, mas sapatilhas grudando as vezes atrapalham.

MOTIVOS

  1. Pressão de molas: podem estar com pouca pressão e não conseguem fazer com que a sapatilha volte; 
  2. Alguma aspereza da chaminé, que pode segurar a sapatilha;
  3. Com o tempo, pode acontecer de a sapatilha ficar com uma marca muito funda, isso faz com que ela se prenda no orifício do instrumento, aí é necessária a troca; 
  4. O fator mais comum é sujeira, pó, umidade, tocar após ter comido doce sem enxaguar a boca.

SOLUCIONANDO

A primeira coisa é olhar para tentar saber o que está acontecendo. De nada adianta limpar, se a chaminé estiver prendendo de alguma maneira a sapatilha.

Limpe as sapatilhas e as chaminés. Pode ser com álcool, fluído de isqueiro também funciona bem, e em seguida coloque algum pó bem fino tipo talco ou pó de giz. Em saxofones pode-se usar lustra móveis, o que além de limpar, hidrata as sapatilhas. 

3. QUEBRAS DE MOLAS

Principalmente em temperaturas mais baixas, há muito mais condensação de ar dentro do instrumento, deixando-o bem mais molhado. 

Os clarinetistas tem o costume de assoprar o instrumento nas partes onde se acumula mais água. Isso é ruim porque ao soprar, essa água se espalha para as molas. Essas molas de aço azul trabalham sob pressão, e se enferrujadas tornam-se mais frágeis e portanto mais susceptíveis à quebras.

Os saxofonistas já não tem tanto o hábito de soprar as sapatilhas e por conseqüência as molas duram mais, além de serem mais resistentes.

CONSERTANDO EM SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA

Voltamos ao nosso Kit de Emergência. É primordial ter elástico no estojo do instrumento. Observando o funcionamento da mola, é possível fazer com que o elástico faça a mesma função dela.

As vezes você pode até ter mais recurso para trocar uma mola, mas dependendo do lugar onde ela quebra, se quebrar próximo à coluneta, não tem muito como tirar, em local sem luz e sem material apropriado, a melhor solução é mesmo o elástico.

4. RACHADURAS

Outro problema mais sério em clarinetes são as rachaduras na madeira. Isso ocorre, principalmente, devido ao choque térmico e umidade. Se o instrumento estiver úmido e mudar de um ambiente quente para um ambiente frio, ou vice versa, esta é a receita básica para que ele se rache.

As rachaduras mais comuns são nos barriletes, e na parte superior do instrumento, porque são os lugares que contem mais umidade.

COMO CONSERTAR UMA RACHADURA?

É considerada rachadura, quando ela é vazante ou quando pega algum orifício. A dilatação da veia da madeira nem sempre caracteriza uma rachadura, e isso pode ser resolvido com técnicas de colagem. Uma rachadura fatal ocorre quando a mesma atinge três orifícios, aí o instrumento esta praticamente perdido, em outros casos há recuperação e o conserto praticamente nem aparece, mas pode voltar a acontecer no mesmo lugar ou gerar outras rachaduras. As vezes há a sugestão de colocação de pinos, mas essa solução é muito agressiva para o instrumento, podendo até rachar em outros lugares. “A Buffet Crampom não coloca pino nesse tipo de conserto”, explica Daniel.

PREVINIDO-SE DE RACHADURAS

Em locais onde possa existir grandes variações de temperatura, existe maiores probabilidades de rachaduras em clarinetes. Isso acontece muito em Campos do Jordão, interior de São Paulo. Lá é um local muito frio, e após tocar, a mudança de temperatura do instrumento muda muito bruscamente, então é necessário tomar muito cuidado.

O fator umidade deve ser considerado tanto para mais como para menos, muita umidade é ruim, pouca umidade também. Em regiões muito secas, como Brasília, por exemplo, é necessário fazer a hidratação da madeira.

CUIDADOS

A hidratação dos clarinetes é feita em oficinas de reparo, mas para quem está fora dos grandes centros e sem acesso à um luthier, pode fazê-lo. 

É possível hidratar a madeira de forma simples, sem desmontá-lo, umedecendo o instrumento com óleo vegetal, não mineral. Pode ser até óleo de cozinha, umedecendo um pano e passando por dentro e por fora, de forma muito delicada e consciente, pouco óleo.

A questão de quantas vezes por ano, vai depender da região. Em climas secos pode ser feito de duas a três vezes ao ano. Em São Paulo uma vez ao ano é suficiente.

5. SAPATILHAS, CORTIÇAS E CALÇOS QUE SE SOLTAM

Esta também é uma situação corriqueira, principalmente pequenos calços de feltro ou cortiça, e aqui mais uma vez nosso Kit de emergência entra em ação.

CONSERTANDO

Podemos utilizar super bonder? Saiba que essa cola é um tanto agressiva, mas voltando à situação de emergência, SIM, é possível sua utilização.

Nas oficinas, os sapatilhamentos e colagem de calços são feitos com colas de contato. Com o passar dos anos, essas colas passaram por modificações, sofrendo melhorias em sua estrutura química, e são a melhor opção. 

É interessante ter no estojo vários pedacinhos de cortiça de diversos tamanhos, no caso da perda de um calço você terá algum disponível. 

É possível também colar uma sapatilha sem desmontar o instrumento, dependendo do acesso que você tenha à ela, mas lembre-se, sempre de forma delicada e consciente.

É comum acontecer das cortiças sofrerem variação com as mudanças climáticas, podendo murchar deixando as junções frouxas. Isso pode ser resolvido encapando-se a cortiça com fitas teflon. Mas lembre-se, se o teflon ficar muito tempo em contato com a prata, ou metal do saxofone, ele pode danificá-la, deixe somente o tempo necessário.

Nos saxofones é muito importante que se retire a boquilha do tudel e seque muito bem a cortiça. Ao montar é bom passar o lubrificante, isso aumentará a vida útil da cortiça.

6. CUIDADOS DE LIMPEZA E MANUTENÇÃO

É muito importante que algumas regras sejam sempre observadas e seguidas

O CUIDADO É EXTREMAMENTE IMPORTANTE, E CUIDANDO, RARAMENTE VOCÊ PASSARÁ POR SITUAÇÕES DIFÍCEIS.

  1. Enxugar muito, muito, muito bem o instrumento por dentro e por fora;
  2. Tenha dois panos, um bem absorvente para secar bem internamente, pode ser do tipo perfex, e outro bem macio para limpar externamente. A limpeza externa é muito importante, principalmente para quem tem a saliva e o suor mais ácidos;
  3. Nos clarinetes, seque todas as junções e cortiças;
  4. Não guardar o pano molhado dentro do estojo, ele poderá deixá-lo muito úmido;
  5. Enxugue as sapatilhas com um papel absorvente para tirar toda a umidade dos orifícios;
  6. Não guarde o pad saver dentro do insturmento, utilize-o apenas para fazer a limpeza interna do saxofone;
  7. Não guarde o tudel do saxofone dentro da campana, ele pode entortar, e o mais comum, é o porta voz ser afetado prejudicando sua abertura. Prefira os estojos que tem espaço próprio para eles.
  8. O estojo é a casa do seu instrumento, de preferência sempre ao original. É importante que o instrumento fique bem firme lá dentro, e não tenha espaço para se movimentar;
  9. Não deixe seu instrumento dentro do porta-malas do carro, além de correr o risco de ser roubado, o calor é muito grande, podendo descolar calços e sapatilhas;
  10. Hidrate e lubrifique as cortiças com “graxas” apropriadas. 
  11. Saxofonista, retire a boquilha do tudel e seque muito bem a cortiça;
  12. Retire a palheta da boquilha após tocar, seque-a e guarde nos estojos apropriados, assim sua palheta terá uma vida útil maior, e sua boquilha também;
  13. Cuidado com os saquinhos de sílica-gel, que as vezes vem dentro dos estojos. Eles servem para tirar a umidade, nos clarinetes deve-se prestar muita atenção, pois podem ser responsáveis por rachaduras. Estes saquinhos só são necessário em lugares onde a umidade relativa do ar é muito alta, como por exemplo em regiões litorâneas;
  14. Não utilize produtos líquidos para limpeza externa de instrumentos prateados, eles podem escorrer para áreas onde você não terá acesso para limpar. Para esse tipo de limpeza, prefira as flanelas próprias com produtos limpa prata, disponíveis no mercado;
  15. Leve seu instrumento a um técnico de sua confiança a cada ano e meio, para que sejam feitas trocas de molas, sapatilhas e regulagens. Um instrumento bem tratado raramente o deixará na mão.

Daniel Tamborin responde

  1. De quanto em quanto tempo são necessárias as revisões técnicas nos instrumentos?

Se o músico for profissional ou um estudante avançado, e necessite que o instrumento esteja funcionando muito bem, e para que o risco de problemas seja mínimo, a manutenção deve ser feita uma vez por ano.

CLARINETES: Costumo fazer o sapatilhamento em um ano e no ano seguinte, apenas uma revisão. Aqui em meu atelier, procedo da seguinte maneira: na revisão eu troco tudo o que for necessário, e no sapatilhamento troco tudo, sapatilhas, calços. Alternando dessa forma funciona muito bem.

SAXOFONES: Se o saxofonista não for erudito, e tocar mais na noite, o instrumento estará trabalhando em condições mais agressivas, sujeito a poeira, umidade, fumaça de cigarro, fazendo com que suje mais, principalmente entre as molas e as colunetas. O músico fica respirando essa poeira. Uma limpeza é fundamental para sua própria higiene, para que você não fique em contato direto com o instrumento. É como escovar os dentes após as refeições. Pelo menos uma vez ao ano, é bom que se faça um processo de desmontagem, limpeza e higienização, justamente para tirar todas as impurezas.

  1. Um instrumento novo, 0 Km, precisa passar por um técnico?

Sem dúvida, e não importa a marca. Invariavelmente instrumentos novos tem ajustes a ser feitos. Essas desregulagens são principalmente devidas ao transporte. Por mais cuidados que se tenha, as viagens são longas, da Europa, Estados Unidos, Japão e Ásia, marítimas ou aéreas. Todos precisam ser revisados, eles sofrem com transporte, variações climáticas. Os instrumentos de madeira sofrem mais, e quanto maior o instrumento, pior. Um clarinete baixo parece um instrumento forte e robusto, porém ele é muito sensível. Até a madeira se acomodar com um monte de coisas “espetadas” nela, leva um tempo, as chaves se movem, os calços e sapatilhas cedem, existe todo um processo. Os instrumentos de metal não sofrem tanto, mas é sempre bom uma revisão.

  1. Amassados interferem na sonoridade do instrumento?

Depende de onde for. Se for próximo a uma coluna e esta coluna estiver próxima de um orifício, pode haver vazamento. Uma batidinha na campana não afeta em nada. 

Há inúmeros casos em que a mecânica é completamente afetada e aparentemente não se nota nada em uma primeira vista, mas em uma análise cuidadosa, esta tudo fora de lugar!

  1. Colocar o instrumento dentro de um balde ou tanque com água, para sanar vazamentos, pode ser feito?

Isso é uma temeridade! Obviamente se o instrumento for colocado na água, as sapatilhas vão inchar e conseqüentemente os vazamentos vão se fechar. Em contrapartida, a madeira, as molas, os calços, ficarão molhados. É uma atitude completamente errada e não deve ser feita nem com clarinete nem com saxofone. Loucura total! Pode funcionar na hora, ou psicologicamente vai funcionar, mas depois vai ficar pior, trazendo prejuízos nas molas que podem quebrar, as sapatilhas vão ficar úmidas por um bom tempo.

  1. Qual a melhor forma de cuidar das cortiças de junções e tudéis?

As cortiças são coladas com cola de contato. É muito comum os músicos utilizarem um tipo de lubrificante derivado de petróleo, mas esses lubrificantes fazem com que com o tempo a cola se solte, descolando a cortiça. O conselho é usar o conhecido sebo de carneiro, esse lubrificante além da ajudar as peças a se encaixarem, protege a cortiça de umidade, impermeabilizando-a. A Buffet Crampom e a Vandoren, já desenvolveram materiais sintéticos bons que também não agridem a cola.

“Uma das coisas fundamentais é a adaptação do músico ao instrumento. Cada pessoa é um músico em particular, então o instrumento precisa ser preparado para cada um, para aquela anatomia, assim como o músico precisa ser preparado para aquele instrumento. Os dois tem que “conversar” por muito tempo até se entenderem. 

O instrumento gosta muito de carinho, dando a atenção que ele merece, você terá o retorno através do bom funcionamento”, concluiu Daniel Tamborin.

Daniel Tamborin é um dos mais respeitados luthiers em instrumentos de sopro no Brasil. Possui uma sólida formação na área, tendo feito cursos na Unicamp, com o Prof. Dr. Ricardo Goldenberg. Na Europa, especializou-se em clarinete e clarinete baixo, no Centre de Formation Pavillon Michel Viot, na Buffet Crampom, em Paris. Na Alemanha, especializou-se em fagotes, na Scheiber. No ano de 2002, recebeu convite da Selmer, para fazer mais um curso em Paris. Nestas mesmas fábricas, participa todos os anos de novos cursos de reciclagem e novas técnicas, sendo assim o único representante oficial destas marcas na América do Sul. “Há sempre a procura pela melhor qualidade, novas técnicas, novas idéias de como melhorar a condição dos instrumentos dos músicos brasileiros. Como oferecer da melhor forma possível uma gama de acessórios de qualidade a preços acessíveis. Trabalho com músicos iniciantes até grandes solistas internacionais, o que é muito gratificante. Gosto de poder oferecer um bom trabalho e o meu conhecimento para resolver os problemas dos instrumentos, que não são poucos”, conta Daniel.

Atua na área desde 1993, trabalhando em sua própria oficina, o Atelier Daniel Tamborin, em São Paulo. Além da parte comercial de vendas e consertos, o atelier trabalha também com produção cultural, promovendo masterclasses, concertos e eventos na área musical. “As grandes fábricas com as quais trabalho disponibilizam solistas para virem ao Brasil através de nossos pedidos. Estamos sempre com projetos em conjunto com elas a fim de trazer algo de bom, mais informações, e o que é melhor de tudo, sem cobrar do aluno, do músico”.

Daniel realiza ainda workshops em diversos festivais e oficinas de música espalhados pelo país, oferecendo toda sua vasta experiência em consertos e reparos de clarinetes e saxofones. Mas ele não trabalha sozinho, sua esposa, Vânia Neves, é responsável pela gerência, contatos e diversos projetos desenvolvidos pelo atelier. Em Leme, sua cidade natal, quem cuida das coisas é seu irmão. Existe por lá uma “filial” do atelier, onde o trabalho é mais voltado para a manutenção dos instrumentos das igrejas da região.


*Autora: Débora de Aquino. Flautista e saxofonista, professora e educadora musical. Formada em Composição e Regência na Unesp e Licenciatura em Música no Centro Universitário Claretiano. Professora de instrumento no CLAM-ZIMBO TRIO e educação musical na Escola Suíço Brasileira de São Paulo. Atua como instrumentista em diversas formações, dentre elas o quinteto instrumental Trincheira MPB-Jazz, em atividade há dez anos, apresentando-se nos principais bares e casas noturnas de São Paulo.

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