Vida de artista não tem hora, não tem dia da semana, férias, porque podem ser dois, três, quatro trabalhos correndo paralelamente. Músicos, bailarinos, atores e artistas em geral chegam em seu local de trabalho e nem sempre tem o melhor equipamento
Você que se revolta quando tem que trabalhar muito além das oito horas por dia, quando passa vários finais de semana trabalhando, quando não consegue tirar folga pra passear, descansar, estar com amigos e família. Você que acha cansativo trabalhar durante a noite mas às vezes precisa… Você que acha um absurdo precisar de mais de um emprego pra pagar suas contas, que se especializou com todo o amor para exercer sua profissão com ética, seriedade e competência. Você, que vive essa odisséia da vida moderna de um mortal comum, acha mesmo que um artista trabalha menos que você ou não merece ganhar um salário decente? Você acha mesmo que, como trabalha por amor, o músico deve se sacrificar sem ganhar bem e se sujeitando a condições de trabalho péssimas? Você acha que o artista merece o que você mesmo não quer pra sua própria vida?
Vida de artista não tem hora, não tem dia da semana, feriado, férias, porque podem ser dois, três, quatro trabalhos correndo paralelamente. Músicos, bailarinos, atores e artistas em geral chegam em seu local de trabalho e nem sempre tem o melhor equipamento, ou lugar pra se vestir, água pra tomar, horário de descanso durante expediente… levam choque no microfone, improvisam com coisas que trouxeram de casa porque infelizmente é comum não ter muita estrutura, pedem roupas de amigos pra fazer figurinos ou simplesmente aprendem a costurar pra conseguir confeccionar o que precisam. Artistas amam muito o que fazem e, por isso, muitas vezes se sujeitam a coisas que, na sua vida de assalariado, seria passível de processo trabalhista… Semanas sem folga, sem sono, sem tempo pra refeições, e até sem receber ou ganhando um refrigerante e uma porção de fritas como “pagamento”. E, cuidado, a bebida pode estar vencida, como já aconteceu quando fui me apresentar com um grupo de dança em um bar. Como não há certeza de que haja trabalho no dia seguinte, abraçamos tudo que vem e nem pensamos nos limites do corpo, mas na missão como artista. E não me diga que o sofrimento é uma opção… a opção do artista é amar e fazer arte, não sofrer. O mercado, da forma que é, impõe essas condições e a gente se vira como dá… e tenta mudar o cenário a passos de formiguinha, mas sempre caminhando.
Você vai mesmo continuar achando que é normal e ok explorar o trabalho do artista pagando com um tapinha nas costas? Pedindo como favor? Ou achando que não faz mais que a obrigação quando se desdobra pra dar conta da demanda? Que “sorte dele ter onde tocar/se apresentar/expor e ainda ter público”? Você acha certo quando falam pra você que tem que engolir tudo no trabalho porque “pelo menos tem um emprego”?
Pense nisso antes de achar que artista optou por essa vida porque quer moleza… Porque a verdade é muito contrária a todo o glamour que muita gente enxerga. E nem vou entrar na situação das leis de incentivo fiscal porque teria que escrever uma bíblia mas, aos leigos, afirmo: a verba recebida quando possível captar para um projeto é como a verba anual da sua empresa, ou seja, é um valor para que algo macro seja executado e a base da pirâmide (o artista ou você, assalariado) recebe um valor fixo que corresponde a bem pouco se relacionado ao valor total despendido para concretizar o plano. Esse assunto vamos aprofundar em outro texto, ok? Segurem a emoção.
Se você é artista, resista quanto possível à cachês irrisórios e posicione-se! Exija condições mínimas de trabalho. Cada vez que um de nós sucumbe à exploração, todos nós somos lesados. Precisamos estar juntos pela nossa classe, assim como no momento em que nos levantamos contra a situação ocorrida com o Ministério da Cultura? Se não nos levantarmos, nada mudará. Eu já me levantei. Vamos juntos?