Trabalhar com música, compondo, interpretando é um desafio. Vender a sua arte, mais ainda.
Ganhar dinheiro com arte, por si só, já é algo bastante complicado. O hábito do consumo de produtos da indústria criativa ainda caminha há passos de formiguinha, mas um outro fator essencial também interfere diretamente na rentabilidade do trabalho com arte e cultura: precificação.
As pessoas mais ligadas às ciências exatas costumam ter duas “caixinhas de recompensa” na cabeça: uma para “recompensas tangíveis”, como dinheiro, e outra para “intangíveis”, como a felicidade, a sensação de dever cumprido e de realização.
Já os sonhadores de humanas e das artes, com frequência tem “uma caixinha só na cabeça”. Ou seja, ficamos felizes por fazermos nosso trabalho e “esquecemos” que isso não paga conta, temos dificuldade em estabelecer um valor para o nosso ofício e caímos em ciladas, como tocar em um bar em troca de um chopp, fazer escambo ou favores pra amigos, já que é tão legal produzir o que amamos.
E é nessa lacuna, a do amor, a da “caixinha única”, que o mercado da cultura e do entretenimento faz fortuna com nosso suor, oferecendo contratos absurdos, assumindo a propriedade das nossas músicas, peças, quadros, obras, e colocando a gente como um mero fazedor de coisas. Quando nossos olhos se abrem após a alegria inicial de um pseudo-reconhecimento, deprimimos, nos sentimos usados, prostituídos mesmo.
Aí você me pergunta: mas como faz pra cobrar direito, como faz pra impor minhas condições se já é tão difícil trabalhar mesmo que seja por 50 contos, Mari? Peço mil desculpas, mas ainda estou tentando responder essa questão. Não tenho uma solução pra nós, o que tenho é uma série de sugestões:
Nunca assine papéis sem falar com um advogado
Mesmo que pareça o negócio da sua vida, que vai possibilitar que você pague as suas contas, nunca assine nada sem consultar um bom advogado. Conheço gente que perdeu direito à suas próprias criações por causa de um contrato de 80 páginas que não foi lido em detalhes;
Tenha um contador
Sei que não é barato, mas se você é um empreendedor, a ajuda de um profissional pra lidar com o dinheiro ajuda bastante a entender quando você precisa na vida real, fora de todo sonho que é a arte;
Não aceite nenhum tipo de negócio que vá contra o que você acredita.
Não aceite nada que vá contra a mensagem que você pretende passar. Se tiver uma pulga atrás da orelha, passo pra trás e busque ajuda para avaliar a situação;
Não subestime sua tristeza.
Se você sentir que não gosta mais da vida, passar dias com muita dificuldade para sair da cama, estiver bebendo ou fumando mais do que o normal ou até comendo compulsivamente, procure ajuda. Isso não é vergonha, é algo essencial para que você entenda seus limites e tenha saúde para exercer sua arte em sua plenitude.
Dê passos pra trás, pros lados, pra frente, mas não pare de caminhar.
É difícil, é dolorido, tem muita pedra por aí, mas você, como artista, sabe como transformar pedras em castelos.
Não cobre muito abaixo do valor praticado corriqueiramente pelo mercado.
No afã de pagar a conta, a gente cobra R$ 10 por um serviço que costuma ser R$ 30. Se começamos tão desvalorizados, dificilmente conseguiremos ajustar nossos preços para nos equipararmos ao mercado sem perder muitos clientes.
Fortaleça seus contatos com outros artistas.
A conexão entre profissionais da classe é essencial para buscarmos melhores condições, fazermos novas parcerias, aprendermos e, acima de tudo, termos mínima sanidade mental para lidar com um mundo que, muitas vezes, acha que sensibilidade é fraqueza, quando na verdade, é uma virtude.
Vamos juntos, por nossa arte, pelo humanismo, pela empatia, pela arte como catalizador de boas coisas no mundo.