O que está acontecendo no mercado? O que vemos nas notícias é totalmente reflexo da realidade?
A história de que tudo depende de como observamos, e de que o copo pode estar meio cheio, ao invés de meio vazio, não afeta a realidade de que, para ser totalmente esvaziado, não se trata de um todo, mas da metade, e mesmo com 50% faltando para ficar cheio, há de se ter perspectiva e líquido para isso.
No mercado musical, vendas são um indicador sazonal de possibilidades, e alívio setorial especifico, mas não bússola de procedimentos, muito menos garantia de êxito por vir.
A questão da crise no mercado da música não se inicia na pandemia, apenas se agrava com ela, porque a falta total de preocupação com os músicos em si, e com a música, já há tempos é factual por parte dos empresários de alguns setores do mercado.
Tenho um conhecido, especialista em big data, que sempre acentua que o importante não são os dados, mas como interpretá-los.
Chego a ver com sarcasmo as notícias de aquecimento de vendas durante a pandemia, com o Guitar Center, nos EUA, anunciando dificuldades financeiras.
Me incomoda o imediatismo do tipo “ukulele está na moda”, e o pessoal manda fazer um monte na China (olha eles aí de novo), nem aí com o dia de amanhã.
É um Armagedom anunciado que ninguém que “conta moedas” percebe.
O verdadeiro interesse?
O empresário precisa parar de ver só quanto ganha e pensar quanto ele deixa de ganhar… O vício da análise do “copo meio cheio” tira a percepção do quanto podia ter de conteúdo.
A quantidade de pessoas que não tem interesse em tocar nenhum instrumento, nem tem incentivo a isso, deveria ser o ponto a ser combatido.
É tanto “troco e moedinha” que aparenta ser fortuna, que o empresário, na preguiça, não investe.
Falar da obviedade torna-se até monótono, mas é a realidade relatada sem máscaras.
E isso tudo, e ainda citando os apps que distribuem música, tratando músico como idiota, mas lucrando nas costas de seu trabalho, trazendo um quadro endêmico, que não tem a ver com a pandemia, mas tem a ver com a ausência de amor pela música.
Tudo se enquadra num ponto específico, em que oferta e procura se trata de interesse e oportunidade… Sem oportunidade de exercer a profissão de músico, com perspectivas de “chegar a algum lugar”, o interesse acaba, os produtos de maior valor de venda encalham, e pronto…
Não deveria ser difícil perceber que uma pessoa confinada numa quarentena busca o que fazer, mas já na crise econômica que se desenha a seguir, os violões e instrumentos adquiridos como hobby são encostados e criam pó.
Eu sei, porque é óbvio, que sem o profissional da música não há instrumentos caros, nem equipamentos caros, somente o vazio da venda sazonal para colecionadores que pagam, e a venda decrescente para hobistas.
Não, o mercado não está “se recuperando”, mas tendo uma certa sobrevida.
Realidade virtual?
Ahhh, mas os youtubers que tocam no quarto aparentam apontar para uma solução, dizem alguns… Qual? Tocar guitarra numa banheira de amoeba para ter likes? Fazer vídeos tocando temas de videogame para ter likes? Fazer covers de músicos de gerações anteriores, que são ícones da música, quando estes morrem, para ter views e likes?
Estaria o mercado de instrumentos escravizado pelo vídeo em streaming de poucos?
Morreu o show em bar?
O concerto? O workshop? A VIDA REAL?
No dia em que a virtualidade tomar o espaço do real, eu preferirei fazer comida para delivery, pois isso não tem substituto virtual, e vida é experiência, cheiro, sabor, ação e reação.
Arte sem emoção não cativa o coração, que dirá os bolsos…
O YouTube e as redes sociais têm menos relevância para o mercado real da música do que aparentam.
Avaliar certos dados sem raciocinar a fundo é como afirmar que o Tinder está ajudando no aumento de casamentos, quando a obviedade novamente se apresenta, e há nisso o aumento no sexo casual e em relacionamentos superficiais, que são a real função do tal aplicativo.
Seria isso que sobrou? O imediatismo? O pessoal só vê o hoje? Não se avaliam consequências? O YouTube é o “Tinder” da música?
A virtualidade no mercado musical ocupa um lugar de fim, quando devia ser um meio para os propósitos reais.
A tecnologia tem de ser facilitadora, e não limitadora.
Quando tudo isso da pandemia passar, talvez o calor humano tenha se perdido, em um distanciamento social que já vinha contagiando antes do vírus.