Serão tempos de cintos apertados e muita criatividade para ao menos manter os resultados conquistados, aguardando uma eventual melhoria a partir de 2016
Tenho escutado prognósticos sobre economia e politica, com consequências no mínimo desoladoras para as empresas. Vale salientar que há outras variáveis que podem trazer eventuais oportunidades em mercados de nicho, parcerias e reduções de custo, conhecidas como variáveis econômicas, sociais, demográficas, tecnológicas e ambientais. Irei explorá-las a seguir utilizando o varejo como fundo, porém aplicáveis e customizáveis a praticamente todos os segmentos e setores.
Variáveis econômicas: o varejo foi um dos setores que melhor aproveitou o crescimento da economia brasileira. A combinação: juros baixos, crédito fácil e pleno emprego fez com que as vendas do setor crescessem a taxas de tigres asiáticos em todas as categorias, incluindo bens de consumo duráveis. Hoje a situação se reverte com outra equação, esta maligna: juros em alta, crédito restrito, inadimplência e aumento na taxa de desemprego.
O segmento de bens de consumo duráveis será afetado mais duramente, face as explicações do parágrafo anterior. Quanto às demais categorias, poderá haver uma mudança para marcas próprias ou produtos de qualidade e preços inferiores. Não obstante valorizarem a qualidade, é melhor comprar uma marca mais em conta que abandonar a categoria conquistada. Aumentar o portfólio e promover as marcas próprias podem ser boas estratégias.
Variáveis sociais: a ascensão da Classe C foi outro impulsionador do varejo na ultima década, conjuntamente com a variável econômica. O cenário futuro aponta que esta classe terá maior dificuldade para ascender na pirâmide, o mesmo ocorrendo com os níveis inferiores. A diminuição na geração de empregos, aliada ao achatamento dos salários face as pressões inflacionária escasseará a chegada de novos clientes, tão bem recebidos na era Lula.
Neste cenário o varejo deverá trabalhar em estratégias de fidelização e retenção da base atual de clientes, adotando a velha abordagem do armazém de bairro, conhecendo a fundo as preferências do seu consumidor. Adotar um modelo de customização em massa será cada vez mais crucial, personalizando e cultivando os relacionamentos. Utilizar as informações provenientes da rede e dos sistemas, o famoso Big Data, será fator crucial de diferenciação.
Variáveis demográficas: as últimas pesquisas do IBGE corroboraram a importância dos idosos, das mulheres e dos solteiros na economia. Seja com mais tempo e dinheiro no bolso face a uma aposentadoria melhor planejada, assumindo o papel de provedor da casa antes destinado aos homens, ou vivendo bem em grandes cidades adotando a máxima antes só que mal acompanhado, estes nichos poderão ajudar o varejo a melhorar sua lucratividade.
Limitações na dieta face a problemas de saúde comuns a terceira idade podem gerar novos produtos, assim como soluções de alimentação mais práticas, entregas em domicilio e menores porções para mulheres e solteiros sem tempo. Em geral, produtos de nicho e que envolvam customização são melhor vendidos, significando margens mais atraentes. Adicionalmente, as lojas de bairro serão primordiais, principalmente nas grandes cidades.
Variáveis tecnológicas: utilizar-se da tecnologia pode ser um fator de diferenciação e conveniência: leitores e etiquetas de RFID que evitem as filas, códigos de barra nos carrinhos que somem as compras, aplicativos e pagamentos móveis que dispensem o uso de cartões de crédito são algumas possiblidades. Com o mercado em baixa, conseguir parcerias com fornecedores em troca de divulgação é uma estratégia viável e simpática.
Sob o prisma da redução de custos, o mesmo RFID poderá ajudar a controlar melhor os estoques, níveis de perda, programações de entrega e integração entre os fornecedores, melhorando a eficiência da cadeia de suprimentos. Tenho acompanhado que num primeiro nível todos os grandes jogadores já fizeram seus ajustes, porém para uma segunda rodada de redução de custos, investimentos serão necessários. E aqui tecnologia terá papel preponderante.
Variáveis ambientais: não bastasse a eterna discussão sobre as amadas e odiadas sacolinhas plásticas, o varejo agora precisa preocupar-se com a falta de água, repetindo-se situação análoga ao racionamento de energia, ocorrido no segundo mandado de FHC. Certamente precisarão se ajustar a eventuais cortes no fornecimento do líquido, contratando carros pipas assim como faziam com geradores há uma década atrás.
O gestor inteligente saberá aproveitar o momento para conscientizar e reduzir o consumo de água e energia, diminuindo os custos fixos de sua operação. Investir em parcerias com fornecedores na criação de produtos sustentáveis pode também ser uma saída, uma vez que sustentabilidade é muito mais que pegada ecológica ou crédito de carbono, podendo ajudar os parceiros a reduzir seus custos, seja de matéria prima, frete ou descarte.
Espero que esteja um pouco mais animado, apesar do pessimismo que ronda a economia. Serão tempos de cintos apertados e muita criatividade para ao menos manter os resultados conquistados, aguardando uma eventual melhoria a partir de 2016. Enfim, esta é a primeira vez que não escuto de executivos e empresários a vontade de que o ano termine, em um ano que não deixará nada de saudades. Seja na economia, política ou futebol.
Marcos Morita – Mestre em administração de empresas e professor da FIA-USP e Universidade Mackenzie. Especialistas em estratégias empresariais, é palestrante e colunista. Há vinte anos atua como executivo em empresas multinacionais. www.marcosmorita.com.br